quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Ai que saudades!

Ai que saudades que eu tenho da minha infância querida, da aurora da minha vida que os anos não trazem mais. (Casemiro de Abreu).

Vez por outra os veteranos DXers reuniam-se na varanda do QTH do Papah Yankee, lá em Maracutaia da Serra, e ficavam horas a fio discutindo ou relembrando os bons tempos de outrora.
Antigamente, diziam, era tudo melhor: a propagação abria mais, as bandas não eram apinhadas de clandestinos, os mata-cachorros não saiam da sua própria faixa, as pessoas eram mais educadas, pagavam QSL com mais pontualidade... Enfim, era tudo melhor. Era tudo tão melhor que chegavam a ter pena dos novatos que, coitados, nunca viveriam os anos dourados.
Papah Yankee deu uma baforada no seu cachimbo e, sem perder o ar taciturno, deu uma tossidinha para então começar a falar. Neste momento, um veterano novato, recém ingressado na terceira idade dos DXers, pensou consigo mesmo: “Por que será que todo mundo que fuma cachimbo tem um ar taciturno? Será alguma coisa ligada ao fumo que os mantém assim?”. Mais não disse, ou melhor, não pensou: ficou com receio de que Papah Yankee tivesse instalado seu novo equipamento DESP (Device for Extra Sensorial Perception), muito usado por certos operadores de 160 metros.
Papah Yankee disse então: “Os bons tempos são aqueles que estamos vivendo, não importando a época em que isso se dê. Cada época”, continuou, “tem sua característica, sua tecnologia, suas dificuldades e suas facilidades.”
“Há alguns anos”, prosseguiu, “os veteranos se queixavam que as coisas estavam ficando injustas porque os novatos estavam usando os então ultra-modernos transceivers, com SSB, tripla conversão e outras novidades. Quero ver vocês fazerem DX com o transmissor em freqüência fixa, chamar geral e correr a faixa toda com o receptor, ou num pile-up, ficar esperando o DX colocar o receptor na sua freqüência. Isto sim é que era DX, diziam.”
Numa outra fase, os veteranos resmungavam que agora sim as coisas estavam mais fáceis: a transmissão com o manipulador eletrônico ficava uma barbada. Diziam: “quero ver vocês transmitirem por horas a fio com o cabeçote.” Isto sim é que era telegrafia, diziam.”
“Mais recentemente”, prosseguiu Papah Yankee, “os veteranos passaram a dizer: “Gostaria de ver vocês operarem um concurso sem computador, como nos velhos tempos, usando a famosa folha de check-dupes ao lado do livro de registro para evitar QSOs duplicados.” (N.E.: era uma folha com 26 retângulos onde cada um recebia uma letra do alfabeto e escrevia-se no retângulo correspondente à primeira letra do sufixo, o indicativo da estação trabalhada, além da folha de log).
“Atualmente, achamos inadmissível trabalhar uma expedição que não disponha de check-log na Internet. Da mesma forma, não conseguimos imaginar um DXer que não receba os boletins de DX no seu correio eletrônico, ou não podemos abrir mão das informações de managers, equipamentos, antenas e outras tantas preciosidades disponíveis ao simples click do mouse.”
“Ou”, prosseguiu Papah Yankee, “a rede mundial de informações on-line, em tempo real como se diz, mostrando quem está operando e em que freqüência. Os atuais veteranos dizem que o prazer da caçada se foi, que o DX era muito mais emocionante, sem auxílio do cluster.”
“A grande vantagem da nossa época, a que estamos vivendo, é que é possível reproduzir, em termos tecnológicos, as condições de operação havidas no passado, mas nunca será possível prever ou antecipar a tecnologia do futuro. Assim, a melhor época é a que vivemos, pela simples razão que estamos dela participando. Não há, portanto, qualquer motivo para achar que as gerações passadas foram mais felizes ou mais sábias.”
“Só não consigo imaginar o mundo sem telegrafia...”, finalizou Papah Yankee, com uma ponta de tristeza e já antevendo um futuro trágico.
Arrectis Auribus
de PY2YP – Cesar

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