sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Pile up - Parte II

Ali pelo final da década de 70 começaram a surgir as grandes expedições, Clipperton, Okino Torishima, operações já destinadas a promover o novos diplomas CW e 5BDXCC. Para o diploma de CW passaram a ser válidos os QSOs a partir de 1975, os QSOs em CW anteriores a 1975 contavam apenas para o diploma misto. Os pile-ups aumentaram mais um pouco.
Nas décadas seguintes os equipamentos, agora já dominados pela tecnologia japonesa, melhoraram muito e trouxeram já incorporados, filtros, VFOs separados e toda a sorte de facilidades, sem falar é claro que não precisavam esquentar antes de sintonizar e outras mazelas dos tempos analógicos. Vieram as bandas WARC ou bandas novas como passaram a ser chamadas as bandas de 30, 17 e 12 metros e os pile-ups aumentaram mais um pouco.
No começo uma expedição de sucesso, de grande sucesso, trazia um log com 8 mil QSOs, pouco mais pouco menos. Uma expedição razoável, daquelas feitas por um único operador, se bem sucedida trazia 2 ou no máximo 3 mil QSOs.
A década de 90 trouxe uma grande novidade: o cluster. Alegria das alegrias, agora os surdos podiam descobrir as figurinhas nas bandas sem corujar, bastava uma olhada na tela do computador e lá estava o DX em cores vivas, apitos, sinos e fanfarras; um clique de mouse e pronto, rádio na frequência do DX pronto para chamar. E eles passaram a chamar ensandecidamente, muitas das vezes sem sequer ouvir o DX. Pândego. Corujar virou coisa do passado. Agora a competência do DXer não se mede mais pela capacidade de ouvir as bandas - estejam elas vivas ou mortas - não se escuta mais o silêncio nem a frequência vazia para sair na frente do pile-up, não é preciso mais frequentar rodadas de DX ou copiar boletins transmitidos em CW, como fazia W6RGG que transmitia todo domingo às 23:00 zulu em 14.040, em razoáveis 30 ppm, um excelente boletim e que colecionávamos para nos orientar durante a semana. Está tudo dominado, basta um acesso razoavelmente estável à internet e pronto está feito um DXer, devidamente nivelado por baixo é claro. Os pile-ups não apenas aumentaram mas passaram a ser instantâneos. Um DXer, ao acaso, escuta uma figurinha chamando geral, trabalha e spota (verbo novo), pronto, está formado o pile-up. Atrelado à evolução tecnológica dos softwares veio outra maravilha: o decodificador de CW. O ferramental para essa gente estava disponível: um rádio estável, um filtro de qualidade, um computador com um decodificador de CW e a transmissão via teclado. Pronto, os incapazes, os surdos, os destituídos passaram a "ouvir" CW, puderam até mesmo entrar num pile-up. Os mais ousados ainda batem: LID UP UP UP quando alguém por descuido transmite na frequencia do DX. E assim nasceram os cops. Até mesmo essa gente pôde sonhar, almejar e chegar ao Honnor Roll em telegrafia, wow! Quando as condições estão difíceis eles fazem papel ridículo; durante a recente operação de 7O6T um desses operadores foi contestado 4 vezes pelo FB operador de 7O, a frequencia estava batida, o sinal não era dos melhores e havia ruído, o software parou de decodificar e o incauto continuou chamando alucinadamente, o operador de 7O batia nas confortáveis 38 ppm: PY2YP PY2YP (o meu indicativo aqui é um mero exemplo para não expor o infeliz), ao cabo da quarta tentativa o operador de 7O6T bateu PY2YP DEAF UR NIL HI e continuou o baile. Mais de uma hora depois o infausto estava lá a chamar... É o reverso da medalha tecnológica. A internet trouxe ainda o sonhado log on line, trabalhou o DX e ficou com medo de tomar um not in log? Basta olhar o log on line e trabalhar novamente.
As últimas décadas trouxe a reboque do avanço tecnológico os maus operadores, mais presentes e ousados em fonia. A falta de educação e respeito atingiu níveis absolutamente escabrosos, principalmente na Europa onde o decantado savoir faire foi literalmente pelo ralo. Essa gente certamente egressa das bandas cidadãs espalha sua grosseria aos quatro cantos descarada e despudoradamente. Triste e lamentável.
Nos últimos anos as grandes expedições passaram a competir entre elas. Não basta ativar um país difícil - seja a dificuldade relativa ao acesso ou seja ela pela obtenção da licença - agora é preciso quebrar o recorde de QSOs. Para ajudar a quebrar os recordes trouxeram uma nova ferramenta chamada leaderboard que mostra, por país, quem são os DXers que mais trabalharam a expedição. Um DXer que trabalhou 15 metros fonia, 15 metros CW e 15 metros digital fez 3 band slots, se este mesmo operador trabalhar as demais bandas em CW, por exemplo, terá feito todas as possibilidades para qualquer diploma e poderá dedicar o seu tempo e esforços para atividades mais úteis. Mas não é assim, os ególatras não se contentam em esgotar as possibilidades para obtenção dos diplomas usuais - afinal, não existe contagem para banda x modo em qualquer diploma exceto para o diploma de maior ego do país - os ególatras precisam, tem uma necessidade quase física de exibirem seus gigantescos egos para a comunidade, tentam trabalhar a expedição em todas as bandas e todos os modos. Nessa fúria incontida deixam, nas mais das vezes, de trabalhar a expedição em bandas mais difíceis que exigem concentração e esforço. Por exemplo, o incauto se mata para trabalhar 20 metros RTTY, modalidade já trabalhada em 15 metros, a banda de 20, igualmente trabalhada em fonia e telegrafia, ele não se concentra em trabalhar o país em 40 metros, banda que ainda não conseguiu, onde precisa não só de horários mais específicos mas de muita concentração. Perdem o foco. Confundem eficiência com eficácia e o preço desse erro é perder o país numa ou noutra banda mais difícil. Mesmo perdendo as bandas difíceis ficam felizes com seus egos inflados, aliás, felicidade é o que conta, afinal isto tudo não passa de um hobby. Maravilhoso, diga-se.
73 DX de PY2YP - Cesar

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Pile up - Parte I

No começo dos tempos os DX só eram feitos essencialmente em telegrafia, embora os QSOs em fonia já fossem possíveis em amplitude modulada, o que se usava mesmo era o bom e confiável CW. Os países não eram contados, não havia DXCC e não havia tanta competição. A revista QST de Outubro de 1935 trouxe um artigo entitulado "How to Count Countries Worked. A New DX Scoring System" escrito por Clinton B. DeSoto, começava nesse instante a interminável corrida à glória de todas as glórias: atingir o pináculo, o topo. Aliás, a corrida propriamente dita só pôde começar em 15 de Novembro de 1945, por impedimento decorrente da 2a. Grande Guerra.
A década de 50 trouxe maravilhas para o DX, um excepcional ciclo solar e uma interminável sucessão de avanços tecnológicos, aprimoramento de antenas, transmissores mais estáveis, receptores mais sensíveis e o surgimento da maravilha dos foneiros: the single side band. Agora sim, até mesmo os foneiros podiam fazer DX. Este invento foi a lona do circo que começava a se armar.
Nesses primeiros anos as expedições eram modestas, levadas a cabo por um par de operadores, não raramente operações solo por algum aventureiro ou por alguém que iria trabalhar pelo exército britânico.em lugares exóticos como Kamaran, Sikkim ou Sumatra, afinal naqueles anos o sol não se punha no império britânico.
Se do lado dos expedicionários as coisas não eram fáceis, do lado gerador do pile-up as coisas, igualmente, eram difíceis. Não haviam informações, os boletins eram poucos e quando chegavam às mãos dos DXers, nas mais das vezes, as notícias já estavam superadas. Localizar um manager era uma tarefa dificílima, os mesmos ingleses que operavam em lugares estranhos não se davam ao trabalho de designar um manager, cobrar um QSL de Kamaran via rádio club inglês era um exercício de muita paciência e maior sorte. O Vicentinho, PY2ELV, levou anos para receber um QSL de AC3PT, o operador era rei de Sikkim, Palden Thondup Namgyal; ele foi preso depois da invasão chinesa e pagou o QSL da cadeia. Esse rei, Palden, era casado com uma americana e inspirou o filme "O rei e eu" estrelado por Yul Brynner.
Os pile-ups embora menos intensos tinham suas dificuldades próprias da tecnologia da época, a esmagadora maioria dos operadores tinham transceivers que ficaram bastante populares depois da chegada do SSB, e nem todos tinham VFO remoto. As linhas separadas, também eram difíceis de operar split, a mais famosa delas a cobiçadíssima linha Collins tinha uma característica terrível, para melhorar o desempenho e a linearidade do VFO cada banda tinha no máximo 200 kHz. Em 20 metros a banda americana em fonia começava em 14.200; o DX colocava seu transmissor em 14.195 e dizia: listen 5 kc and up. O pobre proprietário da linha Collins tinha que colocar o TX em 14b e o RX em 14a, resultado: o infeliz não conseguia ouvir o retorno do pile-up sem mudar o receptor de banda, correr o VFO para a banda 14b e voltar para a banda 14a a fim de ouvir o DX. Surgia dessa dificuldade a grande obra da engenharia: a linha Drake que conseguiu a mesma linearidade no VFO usando permeabilidade, o núcleo de ferrite corria por dentro da bobina, grande sacada, sem dividir a banda, ouvia de 14.000 a 14.500 kHz. Além disso era possível ouvir o retorno do DX pelo VFO do TX, isso mesmo, podia-se operar: transceiver pelo receptor, transceiver pelo transmissor e separado, recepção pelo RX e transmissão pelo TX. Sucesso total, 9 entre 10 membros do Honnor Roll eram possuidores das linhas Drake.
Depois vieram os transceivers com recepção transistorizada, as válvulas, poucas, somente aqui e ali e no tanque final, e os pile-ups foram aumentando.
Nos tempos das expedições pequenas, os pile-ups em geral eram na mesma frequência, os operadores se aquietavam quando o DX batia qualquer letra que não fosse do seu indicativo, não havia o DX Code of Conduct, não era preciso.
Nas décadas de 60 e 70 haviam grandes operadores que faziam suas expedições solo: SM0AGD, VK9NS, DJ6SI, DK7PE, SM7PKK e vários outros, levavam um transceiver, um manipulador, antenas de fio e muita dedicação.
73 DX de PY2YP - Cesar